Publicada em 2005

Um anão motoqueiro de terno, gravata e capacete entra queimando pneus numa curva do Largo do Machado, no Rio de Janeiro. O velocímetro bate os 50 km/h, compatíveis com a minimoto. O carburador barulhento espanta os pombos da praça e chama a atenção dos passantes. “Meu Deus, o que é aquilo?”, surpreende-se um morador. É Manoel Pimenta da Costa, 78 centímetros de altura, que acaba de sair das compras nas Casas Sendas.

É a segunda vez que Pimentinha – como é chamado carinhosamente pelos amigos – manda ver numa curva em alta velocidade. A primeira foi no dia em que comprou a moto. Fã de Ayrton Senna, ia animado mostrar a máquina aos amigos, mas se empolgou numa curva e deu com a cara no poste, a cem metros de casa. “Fui desviar de um carro e perdi o controle”, tenta justificar o motoqueiro, que não precisa de carteira e não paga IPVA. Socorrido por um médico, “meio tonto da cabeça”, foi levado para um hospital. A moto quase teve um destino trágico. Só coube na traseira de uma caçamba da Comlurb, a empresa de coleta e lixos da cidade, que a despejou, intacta, em frente ao pronto-socorro.

Não é de hoje que Pimentinha passa por poucas e boas com a minimoto. Achou o modelo na internet e pagou R$ 3.300 à vista numa importadora. Não sabe quantos quilômetros faz por litro. “Vou botando gasolina e ando”, explica. Roda toda a cidade sem medo de ser massacrado pelos ônibus e virar fóssil no asfalto. Depois do primeiro choque, também perdeu o medo dos postes. “Agora quero uma mais potente”, diverte-se.

Dublê de motoqueiro e ator de TV

Pimentinha nasceu na pequena Ibiapina, no interior do Ceará, onde viveu com 20 irmãos – oito deles vieram para o Rio. Vítima de paralisia infantil aos 5 anos, sofreu para estudar. Começou tarde, mas completou o ginásio, encontrou força na religião e se descobriu comediante. Vive rindo, até da própria estatura, e assim venceu o trauma de infância. Voltou a andar, e hoje até dança. “Sou o modelo da família”, brinca.

Longe dos padrões de beleza que garantem a boa vida dos galãs de TV, chegou ao Rio há dez anos com o sonho de ser ator. Descoberto por um diretor da Globo, conseguiu o ganha-pão na emissora. Já fez ponta em nove novelas. Nunca o viu? “Fui um dos herdeiros do Francisco Cuoco no final de Cobras e Lagartos”. Não lembra? Talvez você o conheça do quartel de Didi Mocó, de Os Trapalhões, com quem gravou por oito meses, ou do Tabajara Futebol Clube, do comédia Casseta & Planeta, com quem atuou por seis anos.

Como atores anões não recebem grandes cachês, Pimentinha se vira animando festas nos fins de semana. Veste-se de diabinho, de Papai Noel, conta piadas em reuniões de adultos. “Faço o meu trabalho e consigo para os outros pequenininhos também”, orgulha-se. Quando não está em serviço, deixa a moto na garagem e atua como barman num barzinho do qual é sócio, no Cosme Velho. Divide o apartamento com quatro amigos. Todos conterrâneos, mas nenhum deles motoqueiro.

Celebridade no asfalto

Conversa fácil, extrovertido e determinado, Pimentinha só se arrepende de uma coisa na vida: ter usado a lábia para tentar a carreira política. Foi há 12 anos, na terra natal, quando se candidatou a vereador pelo PSDB. “Perdi por 50 votos”, lembra. Quatro anos depois, mudou de lado e fundou o PT da cidade. Novo fracasso. Ainda filiado ao partido lá, não tem o mesmo ânimo por aqui. Virou opositor do presidente Lula, a ponto de escrever – e recitar – um poema de protesto.

Pimentinha só não ganha dinheiro com a moto. Apesar de despertar a atenção dos outros, considera-a apenas um meio para correr pela cidade. “As pessoas tiram foto, filmam. Um dia um policial me parou na saída do Túnel Santa Bárbara. Eu disse ‘Meu Deus, tô perdido’. Mas ele queria saber onde eu tinha comprado a moto”.

Certa noite, em Copacabana, aproximou-se um grupinho de belas mulheres. Queriam tirar foto na minimoto. Ele foi logo se adiantando, malandro: “É mais fácil você sentar na moto e me colocar no colo”. Dito e feito. Pimentinha saiu bonito na foto.