O aposentado Jos� Ferreira acorda cedo e se dirige ao escrit�rio de uma empresa onde trabalha em S�o Bernardo do Campo, no ABC paulista. A alguns quil�metros de sua casa, Jaime In�cio se veste para encarar o trabalho de torneiro-mec�nico enquanto Junival In�cio bate um papo com os amigos na rua. Na mesma cidade, Marinete Cerqueira e Maria Moreno cuidam de suas casas. Em S�o Paulo, Ruth Gimenez chega a uma escola para fazer a faxina nas salas de aula.

A rotina dos personagens acima seria normal, como a de milh�es de brasileiros, n�o fosse um fator que os diferencia. Eles levam um Silva no sobrenome e s�o irm�os do presidente da Rep�blica. O parentesco com Luiz In�cio Lula da Silva mudou suas vidas e, aos poucos, os seis est�o aprendendo a lidar com os pr�s e contras de serem familiares do homem mais poderoso do pa�s.

N�o que os irm�os do presidente estejam colhendo benesses do parentesco. Pelo contr�rio. Nenhum deles nem seus filhos ocupam cargos no governo tampouco recebem ajuda financeira do parente ilustre. Mas se algu�m perguntar aos Silva o que mudou em suas vidas depois da posse de Lula, encontrar� um ponto comum nas respostas. Todos tornaram-se alvo de ass�dio e dos mais variados pedidos de ajuda, desde um empr�stimo de dinheiro a uma libera��o de material importado na alf�ndega de um porto. Jos� Ferreira, o frei Chico, � o irm�o do presidente que mais recebe apelos. N�o reclama, mas confessa que o ass�dio mudou sua rotina.

– Deixei de ir a festas e fico mais em casa. Mudei o n�mero do meu celular e do telefone da minha resid�ncia duas vezes. Mas sempre me acham. O povo pensa que o Lula pode resolver tudo, e as pessoas nos procuram (os irm�os) para tentar resolver seus problemas – comenta, resignado.

Apesar de calmo – uma virtude t�pica em religiosos – Ferreira n�o � frei. Ganhou o apelido na juventude, devido � calv�cie precoce. A paci�ncia, no entanto, encontra limites diante de pedidos inescrupulosos que chegam � sua casa.

– J� me pediram empregos, dinheiro e moradia. Teve um pedido rid�culo de um empres�rio. Disse assim: ”frei Chico, me ajuda a liberar um material na alf�ndega do porto (de Santos) e voc� vai ganhar muito dinheiro”, revela, indignado.

Frei Chico n�o se policia ao relatar fatos desse tipo. A simplicidade � peculiar � fam�lia Silva. Abordado por telefone, Junival, o Vav�, retruca logo ”� rapaz, como � que voc� vai? Pode falar � vontade”, disse, do outro lado da linha, como se o interlocutor fosse um velho conhecido. Agora aposentado, aproveita a conviv�ncia com os amigos, agora conselheiros.

– Meus vizinhos est�o sugerindo que eu ande com seguran�as, mas n�o acho que � preciso – conta, rindo. – Um dia pediram para auxiliar no pagamento da faculdade de um menino. N�o posso, n�? Mas tudo que me enviam, eu mando para Bras�lia.

O irm�o Jaime n�o � t�o comunicativo quanto Vav�. E admite que ainda n�o se acostumou com a nova fase.

– Na rua todo mundo pergunta se sou mesmo irm�o do presidente – diz o torneiro-mec�nico, que evita procurar Lula em S�o Bernardo. – Ele � muito ocupado para isso.

Ruth demonstra ser a mais preocupada do grupo. Tem motivos. A ela chegam solicita��es descabidas para a realidade de uma simples funcion�ria de escola.

– A cobran�a a Lula � grande. J� tive pedidos de rem�dios e at� para redu��o de pena de um presidi�rio. Houve tamb�m autores de livros pedindo que enviasse os exemplares ao Lula. Os vizinhos n�o incomodam – diz Ruth, que n�o quer privil�gios na escola por ser a irm� do presidente.

A irm� que mais conviveu com Lula, Maria Moreno, divide o tempo entre a fam�lia e os pedidos. O �ltimo deles? Uma passagem a�rea para a Bahia. J� Marinete n�o tem problemas com as solicita��es. Conta que passa despercebida por onde anda. Sua distra��o � ir ao cabeleireiro, �nico lugar onde �, de forma discreta, ovacionada:

– A turma fala que eu vou mudar depois que ele virou presidente. Mas n�o mudo – promete.

Amanh�, Ruth far� faxina na escola, Jaime vai para a metal�rgica, Marinete e Maria cuidar�o de casa, Vav� se encontrar� com os amigos e frei Chico voltar� ao escrit�rio para dar expediente.