Escola do Estado em periferia do Rio � exemplo em ensino para crian�as especiais

Quem conhece a escola, escondida em um bosque em Quintino, Zona Norte do Rio, se pergunta como uma entidade p�blica conquistou e mant�m um dos mais cobi�ados certificados de alta efici�ncia do mercado. A qualidade no ensino da Escola Especial Favo de Mel pode ser vista em detalhes, como um refeit�rio lotado de crian�as sem um peda�o de papel no ch�o, no encaminhamento de alunos a um emprego, ou no ato simples da diretora Maria Cristina Lacerda parar sua refei��o e ajudar um estudante a desfiar a carne no prato.

Um detalhe: A Favo de Mel, unidade da Funda��o de Apoio � Escola T�cnica do Estado do Rio (Faetec), trata de crian�as e adolescentes excepcionais.  

Existe h� oito anos, tempo suficiente para que, sob a �gide de um programa diferenciado, a escola se transformasse em refer�ncia para pais, professores e estudiosos do assunto. A Favo � a �nica escola p�blica de ensino especial no Brasil – e uma das poucas de ensino b�sico – a possuir o certificado ISO, concedido no pa�s pela ABNT (Associa��o Brasileira de Normas T�cnicas).

– A educa��o especial � cara. O sistema nos cobra muito e deve-se ter um esp�rito empreendedor sempre – destaca Maria Cristina, professora com mestrado na UERJ, h� 35 anos dedicada ao tema, que lhe rendeu tamb�m os pr�mios Qualidade Rio, em duas ocasi�es, e o Nacional de Refer�ncia em Gest�o Escolar. – Temos que trabalhar com amor, mas principalmente com profissionalismo – continua ela, que conhece pelo nome cada um de seus 200 alunos.  

Embora a escola sofra com a curta verba e pequenos problemas de infra-estrutura – como qualquer outra institui��o de ensino p�blico – o diferencial se consolida na coletividade. “A nossa diferen�a est� na integra��o e participa��o.

H� uma proposta educacional de grupo”, explica Maria Cristina. A dire��o criou comit�s de pais, professores, funcion�rios, alunos e at� copeiros, eleitos pelos seus pares. Re�nem-se mensalmente para discutir os pr�s e contras de cada situa��o. Alguns pais, ali�s, permanecem na sala destinada a eles, com psic�logos e orientadores, e dali monitoram os filhos.

– Temos uma m�dia de 20 a 25 pais presentes, que ficam na escola at� seis horas di�rias – lembra a diretora.  

Essa presen�a constante n�o � mera preocupa��o. Dia sim, dia n�o, o gabinete de Maria Cristina recebe algum aluno que extrapola no trato com o professor. Em casos mais graves, recorre-se aos pais.

– As pessoas n�o ouvem os deficientes, h� sempre algu�m falando por eles. Eles (os deficientes) j� t�m dificuldades em construir seu senso cr�tico, ent�o, se continuarmos a trat�-los assim, nunca v�o tomar iniciativa. A partir do momento que nos direcionamos a eles, sentem-se respeitados e se d�o conta de como s�o valorizados.

Maria Cristina � atenta ao vocabul�rio. N�o puxa para si o m�rito da dezena de pr�mios conquistados pela Favo. Entoa a conjuga��o na primeira pessoa do plural para justificar metas cumpridas, �s vezes pequenos objetivos, mas significativos do ponto de vista pedag�gico.

Enquanto ela conversava com a equipe do Correio, o fot�grafo Leolino Souza ouviu um som long�nquo de um viol�o. Descobriu, tr�s salas adiante, um grupo de adolescentes cantando ao som do instrumento de um professor.

O ISO 9002 foi conquistado em 1998 e renovado em novembro do ano passado, migrando para ISO 9001:2000. As inspe��es s�o anuais. A equipe da ABNT avalia, por exemplo, o trabalho em equipe e o curr�culo do corpo docente – a Favo possui 23 professores, sendo 25% com mestrado e 15% em doutorando.

– O que nos levou a dar o certificado foi o fato de ser uma institui��o p�blica que buscou a certifica��o com m�ritos, com prova de que � eficiente. Ver uma organiza��o p�blica como a Favo com esse tipo de qualidade � fundamental para o ensino p�blico – justifica o gerente de certifica��o da ISO para o Brasil, Guy Ladvocat. – O trabalho que � feito na Favo � de alt�ssimo gabarito, que a coloca em n�vel de primeiro mundo. Isso se v� no rosto das crian�as de l� – elogia Ladvocat.  

O n�mero de professores talvez seja pequeno se comparado a outras institui��es, mas a diretora destaca a dedica��o da equipe ao aluno em programas direcionados. Como o de encaminhamento a empregos.  

– Temos uma orientadora aqui destinada a conseguir vagas no mercado para os alunos que passam dos 18 anos. Antes disso, n�s os ensinamos valores como �tica e auto-estima. Muitas vezes voc� consegue o emprego, mas eles n�o permanecem porque n�o est�o preparados para aquela realidade. Ent�o desenvolvemos um trabalho de cidadania, postura, e promovemos visitas �s empresas para que eles comecem a se identificar com o ambiente – diz Maria Cristina.  

A �ltima conquista foi a parceria com a Petrobras para doa��o de ferramentas e sementes para a horta criada na escola. L�, os alunos plantar�o verduras e legumes. E a esperan�a de mais respeito enquanto seres humanos.    


Refer�ncia e conquistas no esporte

A Favo recebe constantemente visitas de estagi�rios da UERJ e UFRJ, entre outras universidades, e de professores. O trabalho desenvolvido na unidade j� foi tese de mestrado de pelo menos 15 deles.

Da entrada da escola, passando pelo jardim interno, pelas 20 salas, por uma biblioteca com t�tulos infanto-juvenis, pelo refeit�rio e pela quadra poliesportiva, constata-se naturalmente que s� faltaria � escola um bom programa educacional para se tornar refer�ncia. E h�.

A entidade fechou parcerias com outras unidades da Faetec para inser��o de seus alunos em atividades culturais e cursos profissionalizantes. Um �nibus pr�prio transporta os alunos dentro do campus. H� um departamento de esportes para atividades como capoeira, Futsal, Basquete, V�lei e Patina��o. Essa modalidade, ali�s, rendeu frutos.

Dois alunos da Favo j� participaram dos Jogos Especiais Internacionais. Ano passado, Cristiane Ennes, 18, ganhou bronze em Patina��o de Velocidade na Irlanda. Em 2001, Jonatas Macedo ficou entre os finalistas no Gelo, no Alaska. Uma grande conquista para quem treinou numa quadra cimentada da Favo de Mel.

A Favo recebe alunos de todo o Grande Rio. Por se tratar de uma entidade voltada para alunos especiais, n�o h� concursos e sim um processo de sele��o envolvendo uma entrevista com pedagogos.  

– A lista de espera j� chegou a 200 pessoas. H�, atualmente, 55 aguardando vagas. Se constatamos que n�o podemos ficar com a crian�a/adolescente por quest�es de uma defici�ncia mental mais aguda, encaminhamos para entidades da prefeitura, como o Fernandes Figueira – afirma a diretora.