O maior cachaceiro do Rio

Beija-Flor, Da Bica, Fa�sca, Galmel, Claudionor, Artista e Cab�co. Na linha de frente, Kibanana, Carib�, Nh�nh� e Tira-M�goa. O escrete acima daria bons apelidos a um time de futebol de v�rzea, mas n�o passa das prateleiras. Estampa, na verdade, os r�tulos das cacha�as do bar do Seu Osvaldo, dono da cacha�aria considerada a mais tradicional do Rio.

No balc�o, o anfitri�o tem o olhar apurador para logo identificar um iniciante. N�o h� segredo. Isso � f�cil para quem passou 28 anos bebendo um litro de pinga por dia. E, se perguntado se j� teve problemas com a bebida, Seu Osvaldo rebate logo, astuto: “O gelo conserva os defuntos e a cacha�a conserva os vivos”, sorri.

Osvaldo Costa, 78 anos, assim se apresenta. Encosta o bra�o no balc�o, com uma toalhinha no ombro esquerdo, um avental e a experi�ncia de quem comanda a Casa da Cacha�a h� 44 anos. Abriu o estabelecimento na Rua Mem de S�, na Lapa do Rio, com o incentivo do chargista Jaguar, at� hoje um dos freq�entadores. Outros, os transeuntes que por ali passam sem dar aten��o �s centenas de garrafas dependuradas, n�o sabem que perdem uma boa aula – at� os abst�mios talvez gostassem de conhecer a diferen�a entre cacha�a e �gua ardente. Pois Seu Osvaldo sabe. E explica:

– Ah, meu fio, �gua ardente vem da f�brica, que engarrafa, naquele processo industrial depois de comprar a bebida – diz, pausadamente. – A cacha�a verdadeira vem da fazenda. � onde plantam a cana, colhem, destilam, engarrafam e lacram, com o nome da fazenda e do propriet�rio como garantia.

Na Casa de Seu Osvaldo, todas as pingas s�o da ro�a, e 80% v�m de Minas, terra que, a seu ver, � a melhor do mundo na produ��o da bebida.

– A cacha�a � a melhor bebida destilada do mundo, mas s� o estrangeiro d� valor – refor�a.

Desde 1960, 3.183 marcas j� passaram pelas prateleiras do Seu Osvaldo. Hoje, garante ter metade delas, e n�o compra mais. Vai esperar agora o estoque acabar para fechar o bar. Os 54 anos de profiss�o, desde a pequena Dona Eus�bia, sua terra natal em Minas, s�o testemunhos da labuta – �rdua e saborosa, diria um bo�mio. Jaguar, diz o Seu Osvaldo, j� ensaia um protesto. Mas ningu�m o faz mudar de id�ia.

– Venho aqui porque gosto de trabalhar, para ver os amigos. N�o ganho dinheiro com a cacha�a – afirma.

Seu Osvaldo n�o vende � deriva. Expert, sabe oferecer uma boa dose, que n�o sai por menos de R$ 2,50. E n�o economiza nas explana��es. Como um fil�sofo de boteco, de fato, diz que a cerveja � o grande mal dos bo�mios e aconselha os amigos que j� passaram dos 45 anos a beber s� cacha�a.

– O sujeito deve ser correto, e fa�o quest�o de servir bem. A cacha�a deve ser bebida acompanhada de um tira-gosto, como queijo ou p�o. Se vejo algu�m beber parado e passar da terceira dose, eu aviso logo. “�, voc� tem que comer”.

Curiosamente, o homem que d� tantas dicas e vive em meio a dezenas de garrafas cheias n�o bebe mais uma dose. Parou em 2003. S� n�o p�ra de trabalhar. “Eu trabalho para viver”, diz. E j� que o homem � dose na dica, vai mais outra: para quem se afoga na bebida por causa de amor, ele sugere medir o v�cio.

– Mulher e cacha�a fazem falta – filosofa, com o esbo�o de sorriso.