Entrevista concedida em abril de 2001, por telefone
Há uma história de que certa vez um menino viajou de trem com o pai. Contam que o velho lhe fez uma pergunta no início da viagem e o garoto, contemplativo, só respondeu horas depois, quando chegaram à estação de destino. Provavelmente, o menino viu e respirou literatura durante todo o percurso, com olhos no horizonte e pensamentos que flutuavam numa imaginação fértil. A criança foi crescendo e a viagem continuou em seus olhos, em suas palavras, em suas metáforas, no semblante sereno e na sensibilidade de um intelectual. O pai, Erico Verissimo, foi o mestre. O filho, Luis Fernando, o discípulo.
Luis Fernando mora até hoje na mesma casa em que seu pai formou o clã dos Verissimo. Longe das badalações – comprometido com literatura até no nome – o filho de Erico só começou a produzir aos 30 anos e, em sua quietude, criou e ainda dá vida a personagens que marcam sua obra e provocam sorrisos nos leitores com humor sutil e inteligente. Mas quando fala, Verissimo beira o monossilábico, ao contrário de seus textos. O berço de tudo isso é uma máquina de escrever IBM elétrica, que tem história: o privilégio de ser confidente de duas gerações de literatos. Era nela que Erico encontrava seu refúgio produtivo, e ainda é nela que Luis Fernando mantém viva a herança de fazer da palavra uma magia.
Como autor consagrado e considerado o melhor cronista da atualidade, você se sente na responsabilidade de ter que escrever bem todos os dias?
Olha, devo tentar sempre fazer o melhor possível, mas isso é circunstancial. Às vezes não tenho inspiração.
E onde você busca inspiração?
A inspiração é misteriosa. Às vezes invento alguma coisa, porque na crônica vale tudo.
Certa vez você disse que só falta colocar “isso é uma ironia” em seus textos. Neste “vale-tudo”, você não se preocupa como o leitor vai interpretá-lo?
Eu tento ser o mais claro possível, mas certos leitores não conseguem interpretar como eu queria.
Você acredita na existência da Velhinha de Taubaté? Qual seria o recado dela para o presidente em relação ao racionamento de energia?
(risos) Nem ela acredita mais no presidente.
E a Doravante, vai escrever sobre isso?
Ela já deu sinal de que vai escrever uma carta sobre o “apagão”. Estou voltando de férias nesta semana e a “Dora” também.
Qual personagem de seus livros você gostaria de encarnar?
Queria ser um pouco a Velhinha de Taubaté. Ter essa ingenuidade que ela tem em relação a Brasília.
Quais são seus pecados como escritor?
A superficialidade. Escrevo muito, todos os dias.
Mas não perde a irreverência…
(risos) Tento dar o melhor possível, tento ser claro…
Como você vê o corpo-a-corpo com o leitor nas bienais?
Acho importante, apesar de eu não ser muito de aparecer, de ter esse contato. Mas não tem muito jeito, a gente tem que aparecer de vez em quando.
Você herdou esse jeito de seu pai?
O pai era introspectivo. Ele também não gostava de aparecer.
Pretende entrar para Academia Brasileira de Letras?
Não pretendo. Respeito os Imortais, mas não vejo muita importância nisso.
Quais as perspectivas para a literatura no Brasil?
A literatura tem futuro. Seja nos livros ou no e-book, que se torna um meio alternativo de leitura. As perspectivas são as melhores possíveis.
Defina Verissimo por Verissimo?
Não sou introspectivo a esse ponto (risos).
Havia um barulho de trem passando ao fundo, parecia um trem… e lá foi Verissimo em outra viagem.